Vem

 

Vem

Portuguese

I.

Vem
dá-me a tua mão
e vem

cegamente
com o véu do sonhos
a cerrar-te os olhos
dando-te por inteiro 
como quem se dá de verdade

e levo-te na palma da minha 
para que não balances
dando-te todas as certezas 
para que nunca te restem dúvidas

Deixa que eu te entardeça 
no palato do sabor dos teus dias
ou como a réstia de luz no fim deles
deixa que te conforte

II.

Vem
toma-te nos teus braços
e vem desesperadamente 

como o ar que te falta
precisa-me

repete o meu nome
na tua noite
até que lhe percas o sentido

como se eu fosse o ressoar de um pedido
que te revolve o pensamento
e não te deixa dormir

Faz-me o fogo da tua vida
aquele que te ateie o corpo 
nas horas em que as aves não cantam

deixa-me ser o som que quebra
a melodia desse teu silêncio
composto de sombras
que nunca soube espantar

III.

Vem 
que eu carrego candeias... 
vem, religiosamente, 
como se a tua vida dependesse disso

crava-me na tua carne
como se fosse parte dos teus sonhos
e tu a continuação dos meus

e perde-te em beijos
traçando com eles desenhos
que eu nunca saberei ler

e eu escrevo na tua pele
criando céus e estrelas
tingindo-lhes auroras
para que os vejas

IV.

Vem
fecha os olhos e vem,
corajosamente,
como se tudo fosse nosso 

sossega
meu bem, sossega apenas

que eu zelo-te o sono 
e canto-te canções de embalar
no nascer do dia
como todas deviam ser

dorme
sem mágoas dorme
que quando abrires os olhos 
eu ainda cá estou
e enquanto me quiseres 
eu fico

e, eu,
estupidamente
(há algo mais estúpido que amar?)
adormeço no teu peito
a contar batimentos

no calor do teu toque
fecho os olhos contigo

por isso vem
de qualquer maneira 
em qualquer forma vem

que eu espero
com os braços e o peito aberto
vem
que eu já não sei ser só

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