ranco a porta devagar
para que não possas entrar
não sabendo que o faço
abres-la calmamente
com a lentidão de um sol
que se arrasta
no nascer de um novo dia
segurando-me nos teus braços
e mantendo-me suspensa
no líquido estagne do tempo
eu deixo,
meu bem, quase o peço
dissolvendo-me em ti
da altura vertiginosa
do topo de um corpo
mas tu não queres lembrar
que sou mais de noites
do que dias
e ficas, em vão,
a agarrar fumos
que colapsam na terra
nessa gravidade errática
das coisas que caem
e não deviam
atinjo, por fim, o chão
num maravilhoso estrondo
com aquelas súplicas
repetindo melodias novas
na minha cabeça
e desperto
de joelhos no chão
como quem vê por fim a luz
e se maravilha e espanta
com os pormenores do mundo
posso, agora, pedir-te
em silêncio
que te mostres
dá-me lume
ou dá-me tempo
ou que tiveres para me dar
e permanece
olhando-me apenas
de joelho a sangrar
com as mãos arranhadas
mas erguendo-me
como se erguem os dias
e as crianças
com uma crença absoluta
em tudo
rogo-te apenas
pela brevidade de um espaço
para lamber as feridas
e talvez me salves
ou eu me deixe salvar
segue-me
vamos criar castelos de nuvens
no primeiro andar de um céu qualquer
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