SEDE

 

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Português

Sol quente. Chão de fritar ovos. Pés suados de calor. Mãos tépidas. Suor correndo apressado nas têmporas. Blusa encharcada. Cabelo transpirado, ensebado e sujo pelo calor abrasador de Goiânia.

Garganta doída de tão seca. Engolia a seco.  Faltava-lhe saliva. Faltava-lhe pouco para chegar a casa e tomar um copo de água fresquinho.

Engarrafamento na Avenida Goiás. Pum! Batida na traseira do seu carro novinho. Engoliu a raiva à seco. Sede medonha! Saiu arfante do carro.

O homem que bateu na sua traseira xingou-o de tudo quanto há nome. Ele quis xingar o homem também, mas a voz estava seca.  Sede medonha.

Limitou-se a dar-lhe um murro no queixo. Estava cansado e com muita sede. Só pensava na água a molhar-lhe o gargalo. Aquela água fresquinha... Fresquinha! Mais um segundo ali, naquele trânsito maluco, sabia que morreria de sede. Pelo menos é a sensação que ele tinha naquele instante.

Pum!

Levou com um tiro no pescoço do mesmo homem que batera na sua traseira. O sangue regou-lhe a sequidão da garganta. O sangue tinha gosto de aluminio. Do mesmo alumínio de que era feita a traseira do seu carro novo.

Só queria sentir o gosto da água.  Tinha sede de água mais do que de viver.

Não morreu de sede. Morreu de ignorância. Mas morreu com sede, bem ali, no sol quente, frito no chão, como um ovo. Mãos frias. Sangue correndo apressado pelas têmporas. Blusa encharcada de sangue. Cabelo transpirado, ensebado e sujo de sangue também pelo calor abrasador de uma briga fútil em Goiânia.

 

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