<p>Da janela do meu quarto, saboreava os aromas que me chegavam ao nariz, trazidos pelo fresco vento que corria apressado, sem que dele pudesse escutar palavra ou novidade. Eram sempre assim as minhas noites, as minhas madrugadas. A idade tomava conta de mim e eu já nada esperava, senão viver ali sozinha, até que um dia o tempo se lembrasse de mim… Certo dia, num daqueles tristes dias, debrucei-me sobre a janela e deixe-me ali estar. Fiquei naquela monotonia dos mesmos pensamentos que teimavam em tomar conta da minha fraca memória. Olhei para o grande jardim que ficava em frente da minha rua. Era o lindo jardim de todas as primaveras que vivi naquela casa. Agora também ele parecia-me triste e abandonado. Fiquei por ali no infinito das recordações que me iam chegando como flashes de uma câmara fotográfica. Lembrava-me daquele tempo em família, das tardes que passamos juntos, dos lanches, saboreando os maravilhosos bolinhos secos que comprava na padaria, das conversas e do som das gargalhadas dos meus queridos netos que ecoavam pela casa. Meu Deus! que alegria. Deixei-me levar pelas melodias dos ruídos que ia escutando, talvez o vento quisesse que nesse mesmo dia ganhasse um presente! Não dei pelo tempo passar, nem das horas me quis lembrar. Começava a não saber distinguir às noites dos dias nem de quando me havia alimentado, ou mesmo, se tomava ou não os medicamentos prescritos pelo médico. Só sei que tudo ia esquecendo, que a memória se fazia cada dia mais fraca e ausente. Sentia-me triste, e abandonada. Todos os dias, tardes e noites ou vice-versa, ficava ali debruçada, no parapeito da minha linda e velha janela. Tão velha quanto eu, porque não me recordo se algum dia a concertei. Esperava que a todo momento àquela alegria de um abraço para consolar-me por todo o tempo que fiquei sozinha e calada, escutando apenas as vozes trazidas pelo vento, observando as árvores que majestosamente bailavam para o meu contentamento. Davam-me alguma alegria, eu sorria para elas e agradecia o espectáculo que me proporcionava bons momentos. Falava-lhes da minha dor, da minha solidão, mas, elas não entendiam. Nunca iriam compreender… Por vezes acho que ficavam tristes, porque as folhas jogavam-se lá do alto, esmagando-se na lama do chão que se acumulava com as chuvas que iam caindo. Nadavam por um tempo e de repente afundavam como alguém que se afoga e não mais emerge. Umas eram coloridas, outras secas e pálidas, tal como eu quando me olhava ao espelho e não me reconhecia… Fiquei ali naquele infinito tempo de me ver sozinha e triste, sem eira nem beira. Ninguém dos que tanto amei voltou para me ver, à não ser o pombo que por ali pousou e ficou. Nesse dia, saí à rua, numa marota madrugada, sentei-me lá fora no banco do jardim e os últimos raios de sol, apareceram-me escondidos, chamavam por mim… Por: Walter Aguiam.</p>
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