Venho contar-lhe, Doutora, a última que o meu marido fez. Ele foi-se,matou-se.
Até para morrer foi mau, sabe.
Enforcou-se em casa. Foram as minhas filhas que o encontraram.
Ao menos deixou umas letrinhas. Dizia que sabia que nos tinha feito sofrer. Dizia também que por isso sofria.
Isto tudo deixou-nos muito atrofiadas, percebe não percebe?
Estava mentalizada para ser uma mulher divorciada, e agora sou uma viúva!
Não bastava a doença que ele me deu, ainda tive que ser eu e a minha filha mais velha a tratar do funeral.
A minha doença está mais ou menos controlada. Vou todos os meses ao médico, mas sabe como é, não é para melhoras.
Foram 32 anos juntos, com muita dor, e que aguentei pelas minhas filhas por não saber que conseguiria viver sozinha com elas.
A última vez que ele me bateu foi há 10 anos e ainda sinto a dor no braço. Toda a vida teve mulheres, toda a vida levou infecções para casa. Aguentei todo, mas quando soube que me tinha passado a Sida achei que era demais. Nunca pensei que um dia o ia deixar. Acho que sempre foi ingénua e acreditei que ele iria mudar.
Quando soube da doença percebi que afinal já nada valia apena.
Agora, ele foi-se e eu fiquei com a pior marca que ele me podia deixar.
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