Esta mulher vê a lua de pé; põe os cabelos à lua; vai com ela até ao mar.
Não sabe que os corpos nas dunas são construções na areia
Que apagam o brilho do orvalho antes do sol levantar
Nem que depois da noite vem o dia: homens secos depois do primeiro cigarro,
Um cão a apodrecer a cada esquina…Come o pão e só o divide com os pássaros.
Sai de casa sem solução para o desespero que leva consigo,
Mas não espera o desespero de amanhã. Sabe morrer sem cair na tentação
De ver as pedras a queimar ao sol. Para ela o sol é sempre nascido
E as crianças têm sempre carinho para dar. As flores nascem sem ninguém ver
E não é preciso responder a quem quer falar para nos dar uma casa.
Se o vento não leva o fumo dos carros, então o fumo faz falta faltar.
As brincadeiras fazem-se à chuva, a paz não é para durar…
Esta mulher o que rouba leva no regaço como quem sorri
Com o coração todo e sem razão para estar vivo. Ama sem ser preciso.
Lava a nossa roupa e tinge-a de todas as cores menos o branco.
Vai de porta em porta sem nada para dar e senta-se no nosso banco
A conversar enquanto nos tira as bengalas, os casacos, as luvas, os chapéus…
Não gosta que a interrompam quando os sinos tocam. Quer embebedar-se
Sempre que possa, fazendo o barulho todo nas ruas e nas praças.
Sem ocasião especial festeja o seu aniversário junto dos seus inimigos,
Os mais queridos a humilhar, a chantagear, a enganar, a matar aos poucos…
É inocência a sua bondade? Não! Acontece que somente só é poeta e rasga a solidão
Mesmo no claro interior da cidade de betão que faz gente ser mais besta
Que animal mais besta que de tão besta parece ser menos homem.
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