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Miragens de sal

 

Cultuam-se miragens de sal

Que corroem os dias;

Estranhas a si próprias,

Caem e permanecem por abrir

Na concavidade oca dos sorrisos

E quando alguém as liberta

Tudo confundem e devoram

Sem critério.

 

 

Os  desaparecidos

Os desaparecidos rogam por nós

Enredados pelos maus caminhos;

Estendem preces às horas mortas

Onde nos perdemos de quem somos

Fazem-nos reflectir no que um dia fomos

Em inteireza e unidade

Antes de sobre nós se terem abatido

As colunas que sustentavam a claridade.

 

 

Nas margens

Nas margens das ruas

Petrificam marés de cigarros apressados

E por entre as arcadas de empreendedorismo

Vendem-se, trocam-se e falsificam-se dados

E vidas por um punhado de euros;

 

Há vergastas feitas de sonhos

Sob os calos sem nacionalidade

E a limpidez de novos horizontes

Obscurece corpos alugados e

Escravizados pelas intempéries

Da ambição e do medo.

 

 

As mentiras

Como as sílabas, as mentiras são

As sibilas do vórtice interior

Das verdades que construímos

 

Nelas nos amamos

Porque sabemos que nos destroem

Sem testemunhas

Sem testemunho

Sem testamento

 

 

Jardins

Jardins onde permanecem

Os sussurros das árvores

Que nunca foram;

 

Manhãs em que as flores

Estão ainda por abrir;

 

Anseios que os pássaros

Gorjeiam aos quatro ventos;

 

Imagens que se ausentam

E não mais regressam

Ao tempo do ser dividido

 

 

Cristais

Irrompem lírios indistintos

Das tuas mãos

Enquanto deponho os meus caminhos

Sob a tua face

 

Os cristais pontificam os momentos

Em que nada nos separa

E conservam as memórias

Quando as paredes branqueiam

De sede e de ausência

 

São, talvez, cal da existência

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