Infância.
Esse luxuoso património disfarçado
de direito universal;
recreio sem portas onde
nem todas as crianças têm entrada.
Adultos congénitos, crescidos da
expropriação da promessa.
Quem por eles exclama
quando a lança lhes furta
o primor do capítulo primeiro,
como se reconstrói, inteira,
a criança que se não foi,
o riso que já desabrochou dor
e os sonhos desfeitos
antes do adormecer.
Dormirão as crianças
que não o são?
Existirá um ínfimo laivo de luz
a esperançar as copiosas
e lúcidas manhãs assombradas,
as histórias de príncipes e fadas
que no intervalo instituído pelo esgotamento
se fazem escutar em surdina, contadas por
lábios das mães de outros.
De que se faz uma criança
senão de encantamento;
e o que resta, afinal, depois
desse corpo pequenino
sumido de morte e frio,
mar imenso de conformado vazio,
espera circunferencial em busca
de alento.
Rebentação imperceptível
contra os ventres das mães que não existem.
Comentários recentes