amor
capítulo I
sonhei-te assim
quase divino
um corpo
que arrebatasse o meu
uma voz
que calasse a minha
um ouvido
que me ouvisse a alma
um olhar
que me fizesse estremecer
um cheiro
que me embriagasse
um toque de luxúria
que me levasse ao delírio
capítulo II
percorri anos
entre corpos tresloucados
de michês baratos
o sol não brotava
o meu coração era preto
um traço seco
na sala
janelas sempre fechadas
a cozinha
cheirava a podre
o quarto não tinha cor
capítulo III
naquele dia
irromperam no alpendre pardais
em nada banais
cantavam desvairados
o chá frio soube a quente
os velhos jornais pareceram novos
arejei a casa
mudei os lençóis
enchi jarras de flores
cozinhei tarte de maça
deixei entrar o gato
tomei banho
perfumei-me
saí
capítulo IV
percorri ruelas
em passos inconscientes
parei naquele bar
de um pequeno balcão
de uma única mesa
um único banco
uma única garrafa
um único copo
um único empregado
e tu ali sentado
um arrepio
um calafrio
um estremecer de corpo
e alma desnudada
capítulo V
contigo a vida passou a ser arte
és hoje baladas do meu jazz e do meu rock
a teu lado os lugares comuns são exóticos
somos telas vivas de pintores
pedra para escultores
palavras para os poetas
música para os cantores
danço agora ao som dos teus sapatos
redopio ao bater das tuas palmas
desnorteio no desejo de muito te querer
amo contigo e em ti a miragem
os desertos e os abismos
juntos crispamos a tristeza
ao teu lado a minha essência é luz de primavera
madrugada
levanta-te ó madrugada
sempre adormecida
amaldiçoada
não te cansas da insanidade
dos loucos embriagados
que se escondem no teu silêncio
e na tua escuridão porque te julgam nada
levanta-te ó madrugada
que as corujas deixarão de ser envergonhadas
dá luz ao breu acomodado
que para não sentir não quer ver
solta-o nas garras da manhã
acorda mares e gaivotas
sai desse silêncio e vai tocar violão
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