CÁ DENTRO…
Assobia, rodando, o vento fustigante de sul.
As vidraças apertam-se contra os caixilhos
e as árvores desprendem os braços exaustos.
A chuva despenha-se fustigando o chão,
gemendo contra as casas, contorcendo-se na esquinas,
agonizando tremente nos charcos.
No céu, as nuvens correm em bandos,
escuras e densas, soltando brados,
rasgando-se em raiva, parindo estrondos,
semeando negrumes.
Olhei-te do fundo do sol dos meus olhos,
rolei no chão húmido de teus suspiros,
beijei sem cessar os teus beijos
e o sol aqueceu em relâmpagos os nossos corpos.
RE(NASCER)
Dispo-me de mim para me encontrar,
nessas ruelas onde a minha alma vive,
deambula, por vezes,
se instala e acomoda para não temer
e se senta no sofá das desculpas do inacabado,
por não querer.
Procuro o feito e o por fazer.
Tiro o pus ao velho,
Arranco a pele apodrecida,
Fico em carne viva,
Rasgo e volto a coser
E visto-me de pano novo.
É tempo de voltar a ser!
ELAS
Vestem-se de todas as cores,
vivem todos os sentimentos,
sabem todos os segredos,
aninham-se no peito,
escondem-se nos sentidos,
trepidam no silêncio,
arranham na garganta,
morrem ali, por vezes,
exangues de cansaço ou de medo,
de espera e saudade,
amordaçadas, gastas,
insensatas, temidas,
mal amadas, questionadas.
Sabem-me, dizem-me, são-me.
As palavras.
MAR DA FOZ
Furibundo, o mar ruge de raiva,
aperta contra si os rochedos, espalha medos,
contrai-se em espasmos,
lança-se frenético na praia,
rebenta-se contra a amurada e o farol.
Furibundo,
o mar solta brados,
ergue os braços, alteia a voz,
Furibundo,
sucumbe aos cansaços,
abraça-se à enseada,
enconcha-se na barra
e adormece com a Foz.
O BEIJO
E o amor dançou na luz que se acabava
E a gente calou
E o burburinho acalmou
E os olhares incrédulos apagaram-se
na noite e nas sombras
E perdurou o ouro das palavras não ditas,
Das mãos dadas em nó,
Dos braços em abraço,
Dos olhos colados no olhar
E a promessa fez-se verdade...
SEM OCASO
A noite cai, mas o encanto da luz subsiste.
As sombras estendem-se sobre as casas que,
mudas e quedas,
apenas assistem.
Lá dentro, a vida aquece as paredes.
O pão fumega em mesas incendiadas de ternura
de olhares que não se esquecem,
de cumplicidades sem tempo,
de esperas,
de futuros,
de sóis inacabados...
Comentários
Gosto. As palavras são
Gosto. As palavras são vestidas de sentidos, cores, humanidade.As palavras abraçam-nos, foi assim que senti. Continua a intervir assim na vida! (Sobretudo gostei de "Renascer").
Obrigada pelo incentivo.
Obrigada pelo incentivo. Continuarei a sentir tudo em tudo e em todos.