Luiz Carlos e eu nos conhecemos na festa de aniversário de uma amiga em comum. Carlos foi o último convidado a chegar à festa. Eu estava sentada bem em frente à porta e logo que Carlos chegou, nossos olhares se encontraram. Não fomos apresentados, mas eu percebia os olhares dele para mim. Quando um amigo com quem conversava se levantou, rapidamente Carlos sentou-se no sofá ao meu lado. Não demorou muito e nós estávamos conversando como se nos conhecessem há anos e Carlos não perdia a oportunidade de trazer drinks e salgadinhos e me oferecer. Depois da festa, os amigos decidiram que iriam a um baile de chopp que acontecia em um clube da cidade. Carlos me convidou para ir com ele e durante o baile, não nos separamos mais. Foi paixão à primeira vista. Nessa noite mesmo Carlos decidiu que me apresentaria a sua família no dia seguinte. Combinaram nos encontrar no sábado e ele me apresentaria aos seus pais e passaríamos o final da tarde no clube campestre, perto da cidade. Esperei até a hora marcada e como eu era muito pontual, não admitia esperar por ninguém, nem tampouco deixava alguém a me esperar. Quando o relógio bateu as duas badaladas, indicando a hora em que deveríamos nos encontrar, eu não esperei mais. Retirei a minha motocicleta da garagem e saí a andar sem destino. Voltei muitas horas depois. Minha mãe então me disse que Carlos estivera a minha procura e havia saído há poucos minutos. Eu não gostei do atraso, mas a curiosidade em saber o que havia acontecido não me deixou sossegar. Telefonei para a amiga de Carlos e contei o acontecido. Disse que estava furiosa com ele e que não costumava esperar por homem nenhum. Depois de dizer tudo o que pensava de Carlos a amiga confidenciou que Carlos estava ali com ela e ouvira toda a conversa. Ele então me convidou para sairmos à noite e jantar. Prometeu ser pontual e assim aconteceu. Namoramos mais de três anos, sempre assim. Ele vinha todos os meses passar um final de semana comigo e eu, sempre que dava, ia visitá-lo na cidade onde ele morava. Casamos algum tempo depois. No dia do casamento, eu fiquei em dúvida, se estava fazendo a coisa certa. Confidenciei a minha mãe, que se o casamento não desse certo, eu me divorciaria. Ficamos casados doze anos e tivemos um casal de filhos. Logo que nos casamos, percebi que faltava alguma coisa no nosso casamento, que eu não sabia o que era. Nos primeiros três anos, estávamos decididos a ter um filho e isso ocupou demais os meus pensamentos. Quando a nossa filha nasceu, eu estava muito feliz e as minhas preocupações, durante algum tempo, estavam restritas apenas à filha. Mesmo assim, eu sentia que havia alguma coisa na relação com Carlos que me deixava triste. O meu marido era muito desleixado. Dizia que me amava, mas nunca fazia nada para demonstrar esse amor. Eu engravidei novamente algum tempo depois e acabei tendo um aborto. Fiquei durante muito tempo com uma enorme sensação de vazio. Ficava horas na janela, imaginando o dia em que eu seria feliz. Eu tinha o meu trabalho, havia aberto uma microempresa com o meu marido e o ajudava sempre que podia, mas não era feliz. Durante muito tempo, fui alimentando a ideia da separação. Quando decidi o que faria, esperei uma ocasião oportuna, em que os meus pais e a minha irmã estivessem presentes, para anunciar a separação. Conversei com a minha irmã, que era bioquímica e disse a ela que estava me sentindo diferente. Não sentia nenhum sintoma que justificasse que havia algo estranho, apenas havia ganho um pouco de peso. A minha irmã suspeitou que eu estivesse grávida. Fizemos o teste e deu positivo. Mais uma vez, eu senti que não era esse ainda o momento da separação. A mãe e a minha irmã me aconselharam a esperar mais um tempo, até o bebê nascer e então eu poderia resolver o que fazer. E foi o que fiz. Resignei-me a ficar junto ao meu marido mais um pouco, até os filhos ficarem maiores. Assim eu teria tempo suficiente para pensar e decidir com mais clareza. Mas eu tinha certeza de que não era feliz. Sonhava em ser amada. Queria que o meu casamento desse certo. Carlos durante esse tempo, demonstrou ser uma pessoa inútil e vazia, sem nenhum interesse pelo futuro dos filhos. Não gostava de trabalhar. Dependia do pai, que todos os meses lhe enviava dinheiro para as suas despesas básicas. Até que chegou um dia em que eu me cansei da vida vazia que levava ao lado de Carlos. Pedi o divórcio. Apesar dos filhos ainda pequenos, eu decidi que iria morar bem longe do meu marido. O advogado que fez o divórcio era o irmão de Carlos e fez com que Carlos ficasse com todos os meus bens. Sai de casa com o carro e levei o essencial para sobreviver bem longe dali. Voltei para a cidade onde morei com os meus pais. A casa da família estava desocupada. Meu pai já havia falecido e a minha mãe estava morando com a minha irmã. No dia em que sai de casa, se preparava um temporal, mas como eu já havia enviado a mudança, com as poucas coisas que eu tinha, resolvi que precisava viajar assim mesmo. Apesar de não amar mais o marido, fiquei sentida por ele não se preocupar nem comigo nem com a segurança dos filhos, pois a viagem era longa. Poucas vezes havia dirigido naquela estrada e muito menos com temporal. Mal eu havia viajado poucos quilômetros, o tempol desabou,A tarde virou noite e não se enxergava nada da estrada. Era a chuva caindo em torrentes lá fora e no meu coração, o temporal ainda era maior. Eu sabia que precisava ser forte. Tinha um casal de filhos viajando no banco traseiro e eles precisavam de toda a minha coragem para atravessar aquele momento. Chegou uma hora em que se tornou difícil prosseguir. Então parei o carro no acostamento e esperei o temporal passar. As crianças estavam inquietas e eu mais preocupada ainda estava em continuar a minha vida depois desse momento. Era uma vida completamente nova e eu estava sozinha. Depois de muito tempo ali parada, o temporal passou. Retomei a estrada e muitas horas depois eu cheguei a minha casa. A sensação de abrir uma casa vazia e se instalar com meus filhos pequenos era apavorante. Mesmo sem móveis, eu montei um colchão de ar que havia levado, comprei um lanche para as crianças e adormecemos os três naquela primeira noite de vida nova. No outro dia, quando o caminhão chegou trazendo a mudança, foi que eu percebi que os meus problemas estavam só começando. Era uma sensação estranha e os meus filhos teriam que se adaptar de qualquer maneira. Procurei uma escola para os meus filhos e conseguiu bem perto de nossa casa e nessa mesma escola, eu consegui trabalhar, como professora, já que havia pedido transferência da escola anterior onde trabalhava. Recomeçar é uma palavra difícil e eu sabia que os problemas estavam só começando.
Débora Benvenuti
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