Prólogo
Segunda de manhã, ai que vontade de ficar na cama. Não há nada para fazer mesmo! Porquê viver no mundo, se a cabeça pode ser o nosso palco?
Mas estou a fugir das minhas responsabilidades. Afinal de contas , é hora de ir ao psiquiatra. É que há “monstros que ainda não foram ultrapassados”. Quer uma apresentação, doutor? Vamos a isto!
Tenho 35 anos, continuo solteiro, mas com algum juízo. Não o tomo por completo, porque quero poupá-lo. Ah! Ah! Que o meu irmão não leia estas minhas confissões, pois sente-se logo frustrado. A terapia que tentou inculcar-me falhou...redondamente!
O importante é que “sobrevivi” a uma paixão louca, daquelas que nos deixam muito ceguinhos. E agora, pensando melhor, a rapariga nem era nada de especial. Ok, há uma pontinha de inveja nestas minhas palavras.
Encontrei-a há meses, ainda bela, com os seus filhos num ...supermercado! Argh , que maldição. Continua bem casada com o Tomás e dedicou-se a tempo inteiro à maternidade.
Às vezes penso como teria sido a minha vida com esta mulher se tivesse a oportunidade na minha juventude de namorá-la. Mediante todas as loucuras que fiz por ela , não poderia ser só desejo....
O meu irmão falhou mais uma vez. Não me apareceram mais “Déboras” e eu por aqui fiquei... taciturno, lúgubre.
Claro que muitas mulheres passaram pelo meu caminho, mas nenhuma era como ela. Eu bem tentava encontrar semelhanças nas minhas namoradas, mas... Nada! Ninguém era uma representação tua. Nem de perto, nem de longe!
E o resultado está à vista. Tornei-me num neurótico, que passa a vida em supermercados , tentando ser o que nunca fui...uma pessoa comum!
Eu quero uma vida, senhor doutor!
Disco 2000
Débora. O seu nome é Débora, Débora. Reparem na melodia do nome! Como é bela. Seios aguçados, cinta apertada, lábios carnudos, dentes branquíssimos, olhos verdes, cabelo encaracolado, mini saia e.... intocável!
Estou a dar em doido! Mas deixem-me explicar melhor a minha nada cómoda "situação"....
Débora tem 25 anos, tem noivo (who cares?!), e está no ultimo ano de Belas Artes. Reside em Sheffield, tem dois irmãos, sendo a mais nova, ou seja a "menina dos papás". Que "sorte" a minha. Andava sempre toda maquilhada pela faculdade. Todos os colegas do sexo masculino seguiam-na e tentavam capturá-la. Mas Débora parecia viver num pedestal. Nós é que sofríamos.
E eu? Desculpem. Não me apresentei . Chamo-me João. Tenho 27 anos e com idade para ter juízo! Mas o que posso fazer? Sou um pinga amor e fiquei hipnotizado com esta deliciosa rapariga.
Seguia todos os seus passos como um cão perdido. Mas nunca ganhava coragem para meter conversa. Ela era tão especial.
O primeiro grande encontro num...supermercado!
Começa a parvoíce...Amor platónico em seu esplendor.... Finalmente consegui meter conversa com esta minha donzela.
-Olá Débora!
-Olá!!
-Tenho notado nos teus trabalhos. São fabulosos. Aceitas a minha humilde companhia?
-Bem , eu também conheço-te! Hoje a data a celebrar é importante , mas umas horas com um colega , sim porque também reparo nos teus trabalhos , não farão mal a ninguém....
-Eu fiquei em puro êxtase. Seguimos caminho sem saber bem por onde ir. Bastava-me a sua companhia.
Ela veio da Grécia... teve uma sede de conhecimento. Estudou escultura na faculdade de St Martin's. Vamos diretos ao assunto. É que em trinta segundos ela disse."Eu quero viver como pessoas comuns Eu quero fazer o mesmo que as pessoas comuns. Eu quero dormir com pessoas comuns.Eu quero dormir com pessoas comuns... como tu".
Bem, o que mais eu poderia fazer? Eu disse: "Eu vou ver o que posso fazer." Bem estas ultimas linhas (a partir da parte em que ela disse que queria dormir comigo) eu imaginei, claro!
Eu em pânico levei-a para um supermercado. Mas onde estava com a cabeça? Eu não sei porquê, mas eu tive que começar em algum lugar por isso começou tudo lá. Eu disse: "Faz de conta que eu não tenho dinheiro." Ela apenas esboçou um sorriso e disse: "Oh, és tão engraçado!" Eu disse "Yeah?, Tens a certeza que queres viver como pessoas comuns?" Mas ela não entendia, ela apenas sorriu e segurou a minha mão. Alugar um apartamento , cortar o cabelo e conseguir um emprego.
E pensava eu, continuamente: "Eu quero dormir com uma pessoa comum ...como tu".
Fnalmente algo dá certo!
Andei uma semana a “espiar” a Angélica, a ex do Tomás (namorado da minha Débora), que o traiu com o melhor amigo! Não é que o copinho de leite tinha bom gosto? Argh, que até irrita! Déja Vu.
Numa tarde, cinzenta, fui ter com a rapariga que podia ser a minha salvação. Era alta, roliça ,olhos verdes, cabelo curtinho, rebelde e lábios carnudos, acentuados pelo batom vermelho.
Iniciei a minha natural conversa de engate . Resultou que nem gingas. Combinamos um encontro mais tarde no Bar Italia , onde lhe expliquei todo o meu plano maquiavélico.
Então como já sabia os hábitos de Tomás , tinha a perfeita noção que toda a santa quarta feira o jovem ia ter ao bar Italia para a sua tosta mista e copinho de leite. Só que desta vez ia ter companhia.
Angélica estava atenta para passar à segunda fase do plano. Débora entrou e ela atuou. E que grande performance, meus caros!
Débora entrou no estabelecimento e Angélica gritou em alto e bom som. ~
-Meu amor, que bom que já esquecestev tudo. Ainda te amo.
Beijou o copinho de leite. Foi um beijo forçado , mas Débora ficou petrificada.
O mundo caiu naquele instante , e eu tinha aparentemente o caminho livre.
Oh, doce sabor da vingança!
O novo milénio
O ano 2000 aproximava-se e a profecia de fim de mundo encaixava-se que nem uma luva na minha mente. Isto porque soube, entretanto, que a Débora voltou com o Tomás. A Angélica desbroncou-se , mas não falou em mim. Ao menos isso. Sentia-me uma nódoa. Não queria mais viver.
O meu irmão Pedro é que foi basilar. Calmo nas paixões, repito, o jovem soube acalmar o irmão mais novo. Não é que ele percebia de mulheres? Pelo menos o seu conselho e a sua calma fizeram milagres.
-João, ainda te vão aparecer muitas Déboras. Com qual cabeça pensaste? Esquece! É uma pergunta retórica. O tempo cura tudo!
Esperem. Algo mudou.
Maturidade? Seria muito bom mas ...nah. Apenas uma consciência fatal. Afinal o que somos, o que eramos e o que poderemos vir a ser no futuro? Isso mesmo. Apenas pessoas comuns.
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