MARIAMAR
Mariamar nasceu sob o signo da água, talvez para tentar apagar aquele fogo que a queimava por dentro. Era uma bela mulher, insinuante e impetuosa, ainda que com a fragilidade de um cristal. Havia nela o entusiasmo de um vulcão em ebulição e a delicadeza de um coração gentil. Na sua meninice, numa manhã cálida de agosto, seu pai, antigo oficial da marinha, levou-a a ver o mar. Mariamar, ao deparar-se pela primeira vez com o infinito vivo, esboçou um largo sorriso. O seu pequeno rosto iluminou-se e tinha no olhar o deslumbramento de quem acaba de presenciar um milagre. Ficou paralisada de espanto. Depois, ensaiou uns passos bêbados em direcção à rebentação e balbuciou o seu primeiro vocábulo: - mar! Hoje, os seus olhos rasgados e claros espelham a profundeza de uma alma oceânica e translúcida. Aquele horizonte sem contorno e sem fim à vista tornou-se no seu refúgio predilecto sempre que desejava estar acompanhada no seu silencioso isolamento, à margem do rebuliço quotidiano da vida moderna. Era o seu porto de abrigo privado e secreto. Ali, na praia, ela era feliz. Observar aquela ausência de limites tranquilizava-a. Quando o poente se impunha, sentava-se à beira do mar e deixava-se afundar naquela vastidão de azul, a sua cor preferida. Permanecia imóvel tempos infinitos, presa à extensão do areal que a invadia de um vagar que só a paz confere. Os seus olhos profundos demoravam-se a contemplar aquele quadro marítimo que lhe capturava o espírito. Experimentava um prazer imenso naquele demorado encontro que a emudecia e a fazia perder a noção de si mesma e do tempo. Contudo, Mariamar era como as gaivotas: uma ave branca com asas de espuma e desejos de um destemido voo até se fundir com o céu. Antes de regressar a sua casa, Mariamar cerrava os olhos por breves instantes, escutava a longa narração das vagas e deixava-se embalar pelas ondas espraiando-se. Sonhava então com lugares onde se cruzam destinos e de onde imergem histórias de encantadoras viagens plenas de promessas.
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