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Fotógrafo: 

Hella.. desliza uma perna fora do edredom de penas, esboçando uma tentativa de levante. Detêm-se com um raio de sol que lhe penetra na retina e cai-lhe sobre o ombro a alça da camisa de seda preta. Sorri com o seu próprio embaraço.
Levanta-se, em busca, ainda tímida, de golfadas de energia. As pernas cambaleantes, os pés descalços em cima do tapete rosa-salmão que não escondem uma silhueta atrevida, imberbe, de momento incapaz de seduzir, inapta a mostrar-se.
Já de pé, com dois goles de café engolidos por uma caneca a escaldar, recebe, franzindo o olhar, a luz forte que lhe entra através dos vidros embaciados da janela. Vê a chuva que ameaça e escuta o som do silêncio. Um silêncio ensurdecedor e que por isso a leva a pegar numa caneta, numa folha solta e viaja, escrevendo:
(...) Porque amanhece, sofregamente devoro nutrientes para te supra_vitaminar.
Espremo 547 laranjas para que em sumo, me sumas.
Tropeço nas pedras da calçada na esperança de sentir o amparo do teu colo, a reviravolta da tua presença, o romper da tua luz.
Corto em pedacinhos toda a roupa, para que num desses rasgos me vistas e me voltes a despir.
Dobro, em série, folhas soltas de papel e espero que me escrevas ao dobrar a esquina. A esquina da Rua das Quimeras, passando p'la Travessa da Utopia, com o terminal na Praceta das Pessoas Singulares.
Penduro no estendal letras sem contorno e espero que o sol as ilumine, liberte peso e lhes trace a linha que falta.
Quando a tinta começa a falhar, voltamos a amanhecer, tardamos a acordar e esperamos que anoiteça, de novo, o poema (...)

Pousa a caneta. Sorri.

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