Medo

 

Medo

Portuguese

“Podem não acreditar. É natural que não acreditem. Até eu, mesmo agora, passado o choque inicial, tenho dificuldades em fazê-lo. Eu regressava a casa no final do dia, não digo que fosse muito tarde, mas as luzes da rua já estavam ligadas. A minha disposição combinava com o tempo, cinzenta, muito cinzenta, quase como se tivesse uma nuvem de tempestade a pairar por cima da minha cabeça. De repente, pareceu-me ouvir um lamento... ignorei, talvez fosse o vento ou até um animal selvagem no parque que fica do outro lado da estrada (bem, para dizer a verdade, os únicos animais selvagens que por lá vi, foram lagartixas e pássaros) ou então, a minha mente a ter um esgotamento. Preparava-me para continuar o meu caminho, quando o ouvi novamente, desta vez um pouco mais audível. Bem, querem lá ver que isto está assombrado, pensei eu. Podem troçar à vontade, mas experimentem passar numa rua escura, deserta, num dia de vento, perto de um parque, garanto-vos que qualquer pequeno ruído assume proporções tenebrosas. Para ajudar, o dito barulho parecia vir precisamente do parque. Boa, era mesmo do que eu precisava para terminar o belo dia que tinha tido. Fantástico! E se eu ... ignorasse a situação? E se continuasse em frente, fazendo de conta que não se passava nada? E se estivesse uma criatura, mesmo ali a uns centímetros de mim, a precisar de ajuda? E se fosse tudo uma artimanha para assaltar os incautos? E se não fosse? E, enquanto a minha consciência se debatia com todos estes prós e contras... outro lamento, mais alto ainda. Muito bem, pensei eu, vamos lá investigar. Sem querer exagerar, afinal eu não sou nenhuma CSI, comecei a vasculhar os arbustos ali perto (vasculhar talvez seja um pouco de exagero... agitei os arbustos com o meu guarda-chuva e sempre mantendo uma distância segura). UHMMMMMMM!!!!!!!! Desta vez até saltei! Agora não dava para ignorar! A criatura tinha que estar por ali. Por isso mesmo, é que eu, apesar das minhas boas intenções, corri dali para fora ou, pelo menos, era essa a minha ideia. O que aconteceu foi que, com a atrapalhação (quem é que me pode censurar?) tropecei no meu guarda-chuva e estatelei-me no chão... ficando frente a frente com uns grandes qualquer coisa brancos! Pronto, caída no chão e à mercê de tal criatura, certamente um duende maligno, vi a minha vida a andar para trás. Desta não escapava, de certeza. UHMMMM!!!!! E a “criatura” revelou-se em todo o seu esplendor! De início, não percebi logo o que era, mas depois a minha única reação foi sentar-me no chão e rir como uma perdida. Ri tanto que as lágrimas escorriam pela minha cara e, pela primeira vez nessa noite, fiquei contente por a rua estar deserta. A pequena “criatura” era nem mais nem menos do que um saco plástico que estava preso na vegetação e que, com a ventania que estava, fazia aquele som muito parecido com um lamento.”

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