UMA HISTÓRIA DE VIDA
Há dias fui procurada por uma mãe no sentido de lhe prestar apoio psicológico e emocional, para a sua situação actual. A viver até há um mês em Portugal, no qual nasceu, foi educada, tirou um curso superior, trabalhou, casou e onde nasceram os seus filhos, viu-se obrigada a abandonar tudo, e quando digo tudo, é realmente tudo, bens e família, para poder procurar um novo rumo de (sobre)vivência para si e para os seus dois filhos, ainda menores. Esta mulher e mãe, sentia-se em depressão, obrigada a sair do seu país pelas circunstâncias, ficou fragilizada ao separar-se igualmente, dos seus afectos.
Como se pode não entrar em depressão? Como se pode dizer que um ser humano tem de ter força, de lutar e de ir em frente, se lhe arrancam a própria dignidade, a que qualquer ser humano tem direito? Como dizer a esta mulher e mãe que melhores dias virão, se o inevitável estrago psicológico e emocional já está feito, por uma separação tão cruel! Depois de 2 horas a escutá-la, a ouvi-la falar sobre a sua vida e o amor à sua família, sobre o desgosto de se sentir excluída, pois embora a situação fosse nefasta para todos os envolvidos, foi ela quem teve de sair, os restantes, ficaram juntos apesar de tudo.
Até mesmo para uma pessoa treinada e habituada a lidar com os vários tipos de dramas como eu, é difícil equacionar as palavras certas, o gesto certo para aliviar tanta dor. Um drama não pode ser curado com outro drama, não se podem fechar portas ou dizer volte para a semana que já virá melhor, que tudo isso passa. Pode já não haver outra semana, para quem se encontra em profundo desgosto e para quem não pode nutrir-se do amor dos seus familiares. È uma profunda responsabilidade, mas há que restituir a dignidade, mesmo para quem está em sofrimento e parece não ver a luz ao fundo do túnel. É preciso reinventar essa luz, é preciso entregar o ombro como um pilar, é preciso dar colo, físico, se assim for necessário.
Foi isso que fiz! Não tenho irmãos de sangue, mas irmãos e irmãs são todas as pessoas que se cruzam no meu caminho. Se nos encontramos, é porque temos alguma coisa para vivenciar juntas. Choramos juntas, gritamos juntas, apelamos por justiça, Demos uns murros numa almofada para libertar a tensão e, por fim, rimos juntas. Abraçamos-mos cansadas e, por uns instantes, ficamos ligadas num abraço comum de profunda partilha de amor, não ao próximo, mas na pessoa presente, em que esta mulher e mãe teve direito a chorar todas as suas lágrimas de angústia, mas também de gratidão.
Passados alguns dias, esta mulher e mãe ligou-me e partilhou comigo que a experiência gratuita que lhe tinha proporcionado, era tudo o que ela nunca tinha recibo da sua própria mãe. Era um amor interrompido. Foi preciso, deixar tudo para trás, cortar os afectos e sentir-se excluída, para se reencontrar. Esta descoberta sobre si própria, deu um novo sentido à sua vida, devolveu-lhe a coragem e a sua inteligente autonomia. Dias depois encontrou emprego fixo, bem remunerado e a seu tempo, poderá reunir-se com os seus filhos, para juntos viverem esse amor tão incondicional.
Esta é uma história de vida, que foi também um exemplo para mim, que não estou acima de nada nem de ninguém. Por vezes, a vida escurece tanto à nossa volta ao ponto de não conseguimos ver nada, perdemos a esperança, perdemos o domínio sobre nós próprios. Mas caso tenhamos a coragem de baixar os braços, não em forma de desistência, mas apenas para deixarmos ir a resistência, a luz volta ao nosso caminho, e alguma coisa de bom terá forçosamente de acontecer. Pedir ajuda é um acto de profunda coragem e humildade, e a vida, nunca fica indiferente a esse gesto, e aponta inevitavelmente, o Caminho. Esta história de vida feita de todos os sentimento que todos nós já vivenciamos um dia, mas é também uma história de coragem e de esperança, que apelando ao amor e à unidade.
Autora. Ana Paula Ivo
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