Divagações

 

Divagações

Portuguese

Ele permanece sentado no sofá do quarto do hotel, à espera de que o telefone toque. Mas o silêncio perdura e ele continua estoicamente à espera... Sente que se está comportando como um jovem adolescente ansioso pela chamada da garota dos seus sonhos, mas até já nem se importa; deixou de se incomodar com aquilo que se possa dizer ou pensar a seu respeito... a começar por aquilo que ele próprio pensa. Afinal, o que realmente interessa é o que sente. Se alguma coisa a situação de catástrofe em que se encontra lhe ensinou foi que, neste mundo, tudo é passageiro. O que se ergue hoje como um símbolo altaneiro de poder e prestígio pode desmoronar-se em segundos, e nada mais restará do que cinzas e destroços. Só a lembrança fica do que foi, mas já não é mais. Porém, alguém disse um dia – ou será frase sua? – que “é eterno aquele que vive para sempre na memória de quem o amou”. Como ele gostaria de poder saber que em algum sítio, neste mundo, alguém o ama ao ponto de o tornar eterno. Mas, será que alguma vez na vida fez algo para merecer esse testemunho de amor da parte de quem quer que seja? Tem as suas dúvidas, pelo menos assim de repente não lhe ocorre nada. Bom, não é realmente verdade... Mas, já foi há tanto tempo... até se esqueceu. Ele tinha vinte e um anos quando esse ser maravilhoso se extinguiu, suavemente, como um passarinho. A sua avó! Os áridos planaltos do Colorado, as imponentes Montanhas Rochosas e as idílicas paisagens dos seus inúmeros rios e riachos atravessando os caniões, tudo passa rápida e inesperadamente pela sua mente. Como é que ele pôde esquecer! Esquecer as maravilhosas semanas de férias que passava em casa da sua adorada avó, a sua preciosa segunda mãe, já que aquela que o dera à luz partira tão cedo. Para a avó, ele tinha sido a maior felicidade que a vida lhe oferecera depois de lhe ter roubado a filha querida. Mas, quis o destino que também ela partisse bem cedo, quando ele tanto precisava ainda do seu afecto. Os olhos humedecem-se-lhe e custa-lhe a engolir, como se tivesse um nó na garganta. Sente que a emoção o domina, que o passado se impõe ao presente. Não afasta o pensamento; pelo contrário, compraz-se na recordação.

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