Certa vez Deus observava crianças a brincar num jardim, algures. Teve, então, uma ideia inusitada: dar um sopro de vida a uma bola de sabão, como uma daquelas que animavam aquela tarde de sol. Esta bola de sabão, no entanto, veria a vida tal como ela é vista pelos olhos de uma criança…mas uma criança que nunca cresce, mantendo a sua essência intacta, a chama divina ardendo eternamente em si, sem manifestação de ego, de sentimento de posse, de vaidade ou ciúme…Simplesmente Ser…Então, sob o seu pensamento, a bola de sabão formou-se, dilatando-se, ganhando forma, até ser entregue ao vento, como um parto que chega finalmente ao fim. Deus não ficou por aí e deu-lhe um nome, para o caso de um dia alguém querer falar ou escrever sobre ela; o Homem precisa de nomes para se lembrar das suas histórias. O nome foi Mandala, pois reflectia todas as cores que Ele inventara ao criar a Vida e a Arte. E Mandala fluiu livremente, brilhando debaixo do sol. Sentia o empurrão gentil do vento, e a dança da brisa nos seus contornos redondos, e isso fê-la flutuar de alegria. Nesse embalo ela correu mundo, reflectindo em si o verde dos campos que visitava, o azul dos mares que contemplava, atrevendo-se mesmo a brincar na dança das ondas… Como era linda a natureza! Sentia o bater do coração da terra, e testemunhava como esse pulsar se unia ao céu, criando uma corrente de energia que a alimentava e a fazia ir mais além, conectada cada vez mais com o que a rodeava. Mandala não pensava porque era apenas uma bola de sabão. Mas Mandala sentia e exultava, saltitando de lugar em lugar, entre as folhas de uma árvore, entre as pessoas que caminhavam, fugindo de um cão, de um gato, de um pássaro, da mão curiosa de uma criança, mas sem medo, porque sabia que todos somos o mesmo, e esse mesmo é o Todo, e o Todo é o bater do coração do Universo, que nunca pára, que nunca morre… Viu o nascer do sol, e viu-o também morrer para o horizonte, que se manteve pleno de vida com as maravilhas da noite, que é bela também, apenas sob uma luz diferente. Viu também um outro nascer, o do Ser Humano, e também o viu morrer; e percebeu que nos pólos opostos, os da Vida e da Morte, existe o fluxo contínuo de uma viagem feita, por vezes, de carne e osso, onde nos esquecemos da nossa essência. Correndo mundo Mandala testemunhou a sua perfeição, e que Deus não fizera nada em vão. Testemunhou, também, que o Homem é o seu próprio inimigo, e que todo o mal que encontrara o seu lugar no mundo para morar, não era fruto do castigo de um Deus rancoroso, mas sim a consequência natural das escolhas feitas no plano terrestre; era o fluxo natural da energia cósmica em acção, num jogo justo de causa-consequência. Era este o motivo da auto-destruição a que assistia, mas era Deus quem levava a culpa…Mandala percebia tudo isto, mas sem julgamento, revolta ou crítica, porque Mandala apenas existia num permanente estado de paz e harmonia. Via homens sábios a tentarem atingir essa plenitude, mas ela tinha uma vantagem: era fruto da doce imaginação de Deus, no entanto não era feita de carne e dos sentimentos que esta acolhe. Ela era consciente apenas da sua essência, e a sua conexão com o Todo era plena. De nada precisava, nada desejava. Mas a vida é frágil como uma simples bola de sabão, e a experiência terrena tem tempo limitado. Mandala sabia-o, ou melhor, sentia-o…Flutuou, flutuou, até se deixar agarrar finalmente pela mão de uma criança. Viu-se reflectida, por segundos, nos olhos dela, em todas as suas cores e nuances. E foi assim que deixou de existir na dimensão terrena, suavemente…para regressar a casa, maravilhada por ter conhecido uma das muitas facetas da Eternidade.
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