Não contava encontrar,
O velho contador;
Em tempos,
Contava estórias de encantar,
Contas de rico teor,
Sobre contas de rico senhor,
Contas que dele sabia contar!...
-Olá, amigo contador,
Que contas,
Amigo sonhador?...
Que contas,
Sobre tuas ideias tontas,
Com que foste sonhando?...
Com uma triste desilusão,
Baixou a cabeça e acenou que não,
Há anos que deixara de sonhar,
E foi contando:
-Conto que já nada tenho para contar,
Já não conto os anos que passam,
Não conto os que estão por passar,
Faço de conta que conto,
E conto que conto,
E volto a contar,
Conto as horas que deixei de contar,
Conto que parei de sonhar;
Já ninguém me tem em conta,
Dão-me um desconto,
E volto a contar,
Só não conto,
Nem desconto,
As contas que ficaram por pagar!...
E conto mais,
Conto que olho,
E volto a olhar,
Conto que vejo um pote,
Cheio do frio que ficou,
Sobre cinzas que a fome não levou,
E volto a contar,
Conto que raspo-lhe o fundo,
Todo raspado pelos donos do mundo,
E volto a raspar,
Conto que conto e volto a contar,
Conto que os olhos de um filhote,
Raspados no fundo do pote,
Me contam ser olhos de fome,
E volto a contar a tristeza no olhar,
De quem já nada come,
Conto que vejo olhos que choram,
E voltam a chorar,
Conto que já pouco conto,
E nada mais quero contar,
E conto que conto,
E volto a contar!...
Conto com quem não me conta,
Que ainda conta comigo para contar,
Conto com quem não me paga a conta,
Essa conta que não conta,
Para as contas que não posso pagar,
E continuo a contar,
Conto que conto,
Que não ter que contar,
É um conto que me vai matar!...
E conto e volto a contar,
Conto que não contem comigo,
Porque nem comigo eu conto,
Para as minhas contas pagar!...
E conto que conto,
E volto a contar
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