1.
Onde estás amor que ainda não conheci?
Por onde erram teus passos de treva escura?
Talvez numa rua cerca que errei e perdi,
Talvez em terras estranhas de secura.
Incógnito amante de brisa e sol,
Por onde erram teus pensamentos de amanhecer?
Aristóteles? Kant? Um simples rouxinol?
Complexos enigmas secretos por resolver?
Incógnito amante de nevoeiro de neve,
Onde pousam tuas mãos de mel?
No ouro de uma aliança ao de leve?
De uma outra mulher a pele?
Oh! Amor que ainda não conheci!
Qual foi o beco escuro em que te perdi?
2.
Negros poços, olhos teus de mil mistérios,
Negrume de enigma e estrelar,
Suave berço de um amor puro e vil,
Onde mergulhei sem olhar.
Erro tamanho, abençoadamente grosseiro,
Esse de um cordeiro se apaixonar,
Por lobo predador, docemente verdadeiro.
Assim lobo e cordeiro se começaram a amar.
Poções negros, esses teus olhos ferozes,
Foram do nosso amor cruéis algozes,
Em que o cordeirinho se afogou,
Nesses poços sem fundo por o lobo se apaixonou.
Apartados por fosso intransponível
Se fitam de margem a margem,
Lembrando a aventura incrível
Que foi de se amar ter coragem
3.
Perdido nas areias do desertas do tempo,
Na minha memória vagueias, sedento,
Com, no colo ,dançarinas de fumo,
E ar e sonho num copo vazio de alcoólico sumo.
A mão que estendo para te tocar,
Cai no vácuo quente e esquecido do deserto,
O grito que laço para te alcançar,
Ecoa, repetido, ausente, inutilmente incerto.
Sorris, olhos teus cegos, ébrios de ilusão,
Presos na breve nevoenta diversão,
Através de mim olham, qual fantasma,
Que por existir, não existe, é miasma.
4.
Mágoa, dor de viver por viver simplesmente….
Porque eu?...
Chove sangue neste quarto que escrevo,
Faíscam faúlhas de ouro liquefeito a meus pés,
E não há mais nada…
Apenas o macio da seda que visto…
O ar é cinzento como a ausência,
Denso como a água gelada.
Vivo porque tenho que viver,… por não morrer…
A faca que tenho nas mãos tem a lâmina embotada.
A corda que cinta o meu vestido,
Quebrar-se-ia na minha garganta antes da vida…
Não há forma de não viver,
Não há forma…Há mágoa.
5.
Tudo e noite longa e escura
Ar asfixiado de fumo
Luzes de nylon e loucura,
Intersecções de becos sem rumo.
Procuro no negro baço o estrelar,
No ar espesso, na névoa colorida…
Mas não há estrela para me guiar,
Só há ruído, esperança perdida….
Avanço apenas para tropeçar,
Tossindo o ar já viciado,
Para num beco florescente achar
Que me perdi num inferno desgastado.
6.
Ventos tempestuosos sopram
Rosnam relâmpagos ribombantes,
Chamas de dor a alma incineram
Em chamas de dor crepitantes.
Emocional apocalipse maldito
Onde o coração repetidamente quebrado,
Pedaço a pedacinho quebrado,
Tilinta ao cair no vácuo infinito.
7.
Imaginação, fonte fértil e eterna
Que a sede instiga ao invés de saciar,
Inquietação escoiceante , febril fera,
Essa a imaginação que só sabe magoar
A esfera da realidade mil estilhaços projecta,
Multicolores, brilhantes, afiados esses pedaços,
Cenários fictícios, ilusória nuvem infecta,
Tudo mentiras doces, floridos sargaços.
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