Samira - A história de uma rapariga de Alcácer Quibir

Samira - A história de uma rapariga de Alcácer Quibir
 

Samira - A história de uma rapariga de Alcácer Quibir

Portuguese

SAMIRA

- A história de uma rapariga de Alcácer Quibir

 

Esta é a história de Samira, mulher estabelecida em Tânger e oriunda de Ksar el-Kebir, a terra onde, séculos antes, desaparecera o rei D. Sebastião... Quando adolescente, Samira costumava acompanhar o pai, um pastor que guardava as suas cabras nas imediações do rio Loukos, onde se deu a Batalha dos Três Reis. De vez em quando, sempre que havia cheias no rio, eram postos a descoberto pequenos artefactos resultantes da batalha e que o pastor se apressava a recolher, levando-os depois para casa. Certa vez, uma das suas cabras desenterrou um belo broche, para grande regozijo do pastor. Este pensou logo na sua esposa e como esta ficaria excitada ao recebê-lo; ela era uma mulher fogosa e gostava de satisfazer o seu marido… Porém, quando este o ofereceu à esposa, colocando-o delicadamente nela, algo bizarro aconteceu: os seus olhos mudaram de cor, a sua face transfigurou-se e a sua voz adquiriu um cavernoso tom espectral. Para horror do pastor, um espírito do deserto tinha possuído a mãe de Samira, na altura em que esta tinha recebido o broche. De acordo com a entidade, o artefacto estava encantado; este tinha pertencido a Daria, uma moura que tinha encontrado o exército de D. Sebastião em Marrocos. Um cavaleiro, que integrava o terço do Algarve comandado por D. Francisco de Távora, dera-o à moura como pagamento pelos seus serviços numa noite de verão, em que uma curiosa estrela luminosa apontava directamente para a lua crescente. Seria, seguramente, um artefacto roubado a uma outra muçulmana…Ainda assim, Daria perdeu-se de amores pelo cavaleiro algarvio, acompanhando-o depois a Alcácer Quibir. Deu-se, então, o combate e, no momento em que uma lança trespassou o peito do seu amado, uma dor aguda invadiu o coração da moura. Entre lágrimas e soluços, amaldiçoou o artefacto que o cristão lhe tinha dado, atirando-o contra uma pilha de corpos que, ensanguentados, jaziam no campo de batalha. A partir de então, todas as muçulmanas que o usassem ficariam encantadas: jamais voltariam a ter vontade de satisfazer as suas paixões com os seus amados, caso contrário, eles pereceriam com a mesma rapidez com que uma estrela cadente desaparece nos céus….

Ao ouvir tal coisa, o pastor apressou-se a arrancar o broche da sua esposa, atirando-o para longe, mas era tarde demais: esta tinha, simplesmente, perdido toda a vontade de se deitar com ele. As noites sucederam-se umas às outras… mas nada. A mulher não manifestava qualquer interesse em receber o marido. E ele, temendo pela própria vida, não se atrevia a tocar na esposa. Samira rapidamente sentiu o desgosto do pobre pastor. Muitas vezes, quando criança, tinha espreitado o pai possuir mãe, umas vezes por trás, outras vezes pela frente, e até mesmo de outras formas… Samira sabia o quanto eles se amavam, pelo que se recusou a aceitar aquela maldição. Um dia, esperou que o pai saísse para o campo com as cabras. Apanhou então o broche e colocou-o na djalaba da sua mãe, ainda adormecida. Prontamente, a entidade possuiu o corpo da progenitora, mas desta vez foi a rapariga que se dirigiu a ele: “Espírito do deserto, como pode a maldição de Daria ser quebrada?”. A entidade olhou para a jovem e respondeu, guturalmente: “A maldição apenas pode ser quebrada se uma virgem muçulmana se voluntariar a continuar a errância de Daria na terra, vendendo-se, enquanto viver, aos cavaleiros infiéis”. Ao ouvir tais palavras, arrancou o broche das vestes da mãe e fugiu para o campo. Repetiu-as várias vezes para si, em busca de uma solução. Os pais não podiam continuar a viver naquela agonia, sem satisfazerem o amor que os unia. Além disso, ela ainda era virgem, apesar de algumas brincadeiras com o membro de um vizinho da sua idade, que morava nas proximidades... Estava decidido: sacrificar-se-ia em prol da felicidade dos pais. No dia seguinte voltou a fazer o mesmo; esperou que o pai saísse para contactar com a entidade: “Espírito do deserto, levanta a maldição que Daria lançou sobre meus pais. Eu própria sou virgem e me disponho a dar continuidade à sua errância na terra”. A entidade apenas respondeu: “Seja feita a tua vontade” e abandonou voluntariamente o corpo da sua mãe. Nessa noite, Samira esperou que os pais se recolhessem e procurou a ranhura na parede por onde os espreitava, quando era criança. Viu o pai deitado na cama, já despido, a olhar dolorosamente para a esposa. A mulher, por seu lado, despia lentamente a djalaba, enquanto contemplava o membro do marido crescer recriminatoriamente face àquele espectáculo. E foi então, quando a djalaba caiu no chão, que murmurou para o esposo: “Aiii marido… Estou com tanta vontade…”. O homem, confuso, respondeu: “Estás com vontade?! Mas como…?”. “Não sei, homem… mas algo me diz que a maldição foi quebrada. Sinto-o dentro de mim… e olha como estou molhada!”. “Tens a certeza?”. A mulher, olhando esfomeada para o mastro do marido, acabou por não responder. Limitou-se a agarrá-lo habilmente, enquanto se punha de cócoras. E foi nesse momento que Samira compreendeu que já não precisava espreitar mais nada, que a maldição tinha sido quebrada e que estava na hora de cumprir com a sua parte. Nessa mesma noite, após os pais, exaustos, adormecerem nos braços um do outro, arrumou a sua trouxa e despediu-se de Ksar el-Kebir, do rio Loukos, e da casa que a viu nascer. Rumava a Tânger e à nova vida que a esperava…

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Historia inquietante

Una historia inquietante con la misma calidad narrativa y las descripciones sugerentes propias de su autor

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