Livro. Artelogy. 2023.
Atingir o ocaso da vida é a demonstração imperativa de que foram percorridos todos os socalcos geográficos impostos pela bússola que circunscreve a nossa existência.
Com um acentuado sentimento de exaltada nostalgia, também eu passei a integrar o universo dos gerontos.
É um universo onde predomina uma cor acinzentada mas que no passado só ostentava tintas com cores coloridas que pintavam os meus dias e as minhas madrugadas gritadas com gáudio e felicidade.
Com uma celeridade vertiginosa, o tempo foi galgando o próprio tempo e eu, alheado das transbordantes consequências advindas do rasgar de cada calendário, fui soprando as velas multicolores que alumiavam a celebração de cada aniversário.
Hoje, e olhando pelo retrovisor da vida, constato que cada vela soprada assinalava a aproximação do fim.
O fim do festim que nos desperta para a impiedosa e irreversível realidade da finitude.
Sinto que com esta reflexão estou a pisar terrenos pecaminosos, mas não quero ser pecador.
Não me assiste o direito de pecar.
Lançado outro atento olhar ao retrovisor do meu passado e estabelecendo paralelos com passados de outras gentes, só me sobra contemplar o infinito e soltar um grito, silencioso, de sentido reconhecimento pela fulgência que tem alumiado a minha vida já vivida.
Fruto do ofício que abracei – jornalista -, vivenciei e reportei quadros reais de vidas reais inteiramente pautadas pela negridão desesperante do dramatismo que ensombra a verdadeira infelicidade humana.
Vasculhada a gaveta das minhas memórias, encontrei pedaços de vidas inteiramente vividas sob o signo da mais austera e dolorosa angústia.
Com a essência ditada pelo rigor, atei esses nacos de vidas vividas na densa negridão de algumas azinhagas cavadas pela própria vida e, sem conseguir amarrar uma ou outra lágrima, fui catapultado a deixar o testemunho escrito destas minguadas Crónicas com Vidas Dentro.
C. G.
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