Os nossos amigos dizem que tenho o olhar desvairado, o andar tropego, a voz misturada. Que por vezes pareço louco, que tenho de avançar. Avançar...dá-me vontade de rir. De rir como um louco. Ou de chorar. Ainda não me decidi. Sinto o coração descompassado, os olhos pesados, não tenho ombros capazes de suportar o mundo. Sempre que me lembro da nossa menina, na nossa doce Amélia, o mundo cai-me. Tento segurá-lo, antes que se espalhe por cima dos meus pés, mas depois vejo-a, a sorrir, tão perto, tão delicada, e esqueço-me que estou a tentar salvar o que puder. Ainda lhe toco, pontas dos dedos esticados, mas não chego a tempo. Aceito. Há vidas que não são para ser e depois há vidas que não são vidas. Quis alguém que estas estúpidas e inúteis verdades servissem uma a cada um de nós. Depois, existes tu, Teresa. Zango-me. Eu sei, não é justo, mas seria errado fingir que não me zango. Zango-me contigo e comigo. De não termos sido capazes de travar o destino. Por vezes, assim do nada, penso na nossa vida, no nosso amor e naquilo em que nos tornámos. Insisto em guardar, esmagados dentro de mim, alguns retalhos de quem fomos. Parece-me, corrige-me se não tiver sido assim, que chegámos a ser felizes. Agora, já não restam cores. Só preto e branco. E cinzentos. E solidao. E nada. Aceito. Ha amores que sao para sempre e há amores que não são amores. O nosso era para sempre, mas não chegou a ser. Choro. Sem aviso. Sem querer. Sempre. A todo o tempo. Perdi tudo pelo caminho. Não sei amar e recuso-me a ser feliz. Talvez seja melhor assim. Aceito. A vida quis-me louco.
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